sábado, 25 de fevereiro de 2012

O que passou

Hoje acordei com gosto de guardado. Fui invadida pelo tempo que passou. Quase podia tocar a neblina suave da nostalgia do momento. A tarde andei por ruas nubladas e cobertas de poças e buracos. Estranhamente pude ver beleza naquela imagem. Lembrei de quando eu (aqui sim) era a moleca que corria e via o mundo com os olhos imaginantes de criança. E as velhinhas nas calçadas, com cheiro de tempo vivido, me convidavam com os olhos a pedir um colo de avó. As ampulhetas de minha alma naquele domingo, pareciam ir e voltar como se, indecisas, não soubessem que rumo tomar.

Mariana Andrade.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012


Sinto você

Eu ainda sinto sua presença.

Você, sensações, sentimentos.

Sinto você em minha respiração, em cada canto em que olho, em uma folha caída no chão debaixo do arbusto seco.

Sinto você em um pedregulho encontrado jogado ao nada. Em uma brisa que acoberta a mudança dos ventos.

Sinto você em desejos, em saudades, em lembranças, lembranças bem vividas.

Sinto você no futuro, aguardando com o coração na mão, doente, com baixa palpitação. Perdidamente apaixonado e pronto para ser amado novamente.

Sinto você no perdão, em momentos, em mensagens recebidas. Em pensamentos passageiros, em sonhos constantes.

Sinto você por onde olho, por onde vivo, pelo que vivo.

Sinto você em minha imaginação, em ilusões rotineiras, em apelos desesperados.

Sinto você em uma melodia distante, um canto amoroso e doloroso. Dor e amor, quanto clichê!

Sua presença, o seu aconchego, suas palavras, seu carinho, tudo tão natural, tão irreal.

Ilusão, vontades, perdição.

Não se trata de uma escolha, de uma opção e sim de uma situação em que a vida nos embriagou.

Sinto sua presença, sinto você, comigo agora.

Nayara Alvim.


terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

E mesmo com toda alegria o sombrio da saudade nunca se afasta. Não se dilui, permanece a dor estridente e doentia, bate bate coração, fere sua alma e leve todas as esperanças.


Nayara Alvim.

sábado, 18 de fevereiro de 2012


O bicho

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos

Quando achava alguma coisa,
Não examinava, nem cheirava.
Engolia com veracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato

O bicho, meu Deus, era um homem.


Manuel Bandeira.

domingo, 12 de fevereiro de 2012


O amor acaba

O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio.
Acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar.
De repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas.
Na acidez da aurora tropical, depois duma noite voltada à alegria póstuma, que não veio.
E acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuto como dois polvos de solidão. Como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado.
Na insônia dos braços luminosos do relógio.
E acaba nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos.
E no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão.
Às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres.
Mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia.
No andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar.
No epifania da pretensão ridícula dos bigodes.
Nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas.
Quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar.
Na compulsão da simplicidade simplesmente.
No sábado, depois de três foles mornos de gim à beira da piscina.
No filho de tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólen e o gineceu de duas flores.
Em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto de desejo.
E o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir.
Em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero.
Nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada.
Em cavernas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e acaba.
No inferno o amor não começa.
Na usura o amor se dissolve.
Em Brasilia o amor pode virar pó.
No Rio frivolidade.
Em Belo Horizonte, remorso.
Em São Paulo, dinheiro.
Uma carta que chegou depois, o amor acaba.
Uma carta que chegou antes, e o amor acaba.
Na descontrolada fantasia da libido.
Às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes.
E muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros.
E acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova Iorque.
No coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor.
E acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados.
E acaba depois se viu a bruma que veste o mundo.
Na janela que se abre, na janela que se fecha.
Ás vezes não acaba e é simplesmente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo.
Ás vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido. Mas pode acabar com doçura e esperança.
Uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor.
Na verdade.
O álcool.
De manhã, de tarde, de noite. Na floração excessiva da primavera.
No abuso do verão.
Na dissonância do outono.
No conforto do inverno.
Em todos os lugares o amor acaba.
A qualquer hora o amor acaba.
Por qualquer motivo o amor acaba.
Para recomeçar em todos os lugares e a qual quer minuto o amor acaba.


Paulo Mendes Campos.



terça-feira, 7 de fevereiro de 2012


Poesia

Veja, há poesia em cada pedregulho
em cada caco de vidro
em cada esquina mal iluminada
e em cada comercial de margarina.

Há poesia nos recados da telefonista
e nas atas de reunião da diretoria.
Há poesia no canhoto do cheque
e na fala do chefe

Há poesia nas solas de tênis gastas
e nas roupas sujas de graxa
Há poesia no trânsito caótico da cidade
e no colega de trabalho que puxa o seu tapete

A poesia, meu amigo
está sempre a se esconder
Ela flerta comigo
e eu tenho que escrever

Tereza Zambrini.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012


Felicidade

Não se acostume com o que não o faz feliz,
revolte-se quando julgar necessário.
Alague seu coração de esperanças,
Mas não deixa que se afogue nelas, 
Se achar que precisa voltar, volte!
Se perceber que precisa seguir, siga!
Se estiver errado, comece novamente.
Se estiver tudo certo, continue,
Se sentir saudades, mate-a.
Se perder um amor, não se perca.
Se o achar, segure-o.

Fernando Pessoa.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012


Sombras Ocultas

Será importante encontrarmos nossas sombras, para que possamos nos sentir plenos? Sera que a luz em excesso cega? Sem as sombras, a arquitetura da vida fica sem relevo. Podemos realizar essa viagem sem dramas, construindo prazer?

Moema Ameom